Fomos
influenciados ao longo de nossa história em acreditar que existe sim um
príncipe e uma princesa encantada nos esperando em algum canto, montado talvez
não mais num cavalo branco, mas pelo menos numa moto ou bicicleta.
Podemos
dizer que o amor é uma construção cultural, variando de um povo para o outro.
Citamos como exemplo o amor romântico construído pelo romantismo ou mesmo o
amor cortês, criado pela Europa medieval, que tinha que controlar forças que
estavam demasiado soltas depois da invasão dos bárbaros.
Ana
Maria Machado escritora, acredita que “a mulher capta o amor sobretudo
pela palavra” e o homem pode até não ser bonito, mas se ele chega com uma
conversa macia, dizendo as palavras certas, imediatamente torna-se fascinante,
sedutor. É o papel pedagógico e catequético
da literatura, ensinar e mostrar a ilusão da perfeição do amor, sugerindo para
cada um que as coisas possuem um começo, um meio e um fim, e que elas fazem
sentido e o final é feliz. Deve ser muito chato ser “feliz para sempre”, é
melhor ser feliz várias vezes, em vários momentos.
Jurandir
Freire Costa, psicanalista observa que atualmente vivemos num pós-romantismo,
saindo de uma fase em que o sentimento era muito valorizado para uma etapa em
que se valoriza a sensação. Acho muito apropriado essa observação, pois essa sensação caminha muito próxima
da paixão que etimologicamente esta na raiz de “patologia”, pathos, que liga-se ao sofrimento.
Paixão tem de ser aquilo que vai desencadear
o impulso, mas o que vai manter a ligação é o sentimento só que é necessário entender
que ser feliz é fazer sacrifícios.
Queremos
que o amor seja absoluto e que seja eterno. Isso se torna causa de angustia,
tensão, estresse e infelicidade do homem e da mulher contemporâneos, por não
conseguirem construir aquele amor ideal que, na verdade, foi divinizado. Nós
transferimos para o amor as qualidades de Deus, mas não estamos conseguindo
transferir para o amor entre homem e mulher um elemento de ligação (‘religião’
que significa re-ligar). Em outros
tempos seria impossível falar em amor sem falar em amor a Deus e ao próximo. As
religiões são fundadas na noção de amor. Falta “religião” no amor.
O
ser humano vive uma liberdade e se considera liberal nos tempos atuais em
diversos contextos, sejam eles sexuais ou de convívio, mas quando o assunto é
relacionamento, ele prende, cerca-se, fecha-se, sufoca o outro para dentro de
si. É um medo de perder algo que nunca possuirá por completo.
Falta
nos relacionamentos mais interrogação do que exclamação, pois o ponto de exclamação
é um traço reto com um ponto embaixo, que corta, divide, termina, sentencia a
conversa, como um punhal. Enquanto a interrogação é curva, como a vida que não
possui uma reta, mas que vai se dobrando e desdobrando em cada novo dia, no
formato também de uma orelha, que quer escutar a resposta do outro. A
interrogação é como o anzol que busca pescar a verdade e talvez o “feliz para
sempre” tenha sido uma verdade contada tantas vezes em nossa literatura que
acabamos achando possível escrevê-la em nossa vida.